O analista sabe que não sabe, o analisante não sabe que sabe
- Maria Carolina Passos
- 24 de jul.
- 2 min de leitura
O analista sabe que não sabe, o analisante não sabe que sabe.
Parece um jogo de palavras, né? Mas há uma profundidade imensa que desvenda a essência do processo analítico.
Imagine-me diante de você, não como uma detentora de todas as respostas, mas como uma testemunha atenta. Quando um paciente chega à clínica, muitas vezes busca uma solução pra sua dor ou angústia. Mas nosso papel não é dar respostas prontas e genéricas. Pelo contrário, é abrir mão de um "saber" preestabelecido.

‘O analista sabe que não sabe’ significa que a vivência do outro não está nos livros, nas teorias, ou mesmo na minha experiência. Ela reside, de forma única e singular, dentro do próprio analisante. Nossa posição é de escuta, de curiosidade genuína, de um profundo respeito pelo mistério que cada história individual carrega. É essa humildade diante do desconhecido que nos permite escutar não só o que é dito, mas o que está nas entrelinhas.
E o analisante? Entra com suas dores, sintomas, súplicas. E na maioria das vezes, sente que "não sabe" o porquê de tudo aquilo.
"Por que sinto isso?", "por que repito os mesmos padrões?", "por que não consigo mudar?"...
O que a psicanálise mostra é que, por trás dessa aparente ignorância, há um saber que escapa ao sujeito e pode se manifestar de forma cifrada. Esse saber não é diretamente racionalizado, não é acessível à consciência de maneira instantânea. Ele se manifesta nos sonhos, nos atos falhos, nos lapsos de linguagem e, claro, nos sintomas. Fragmentos de sentido soterrados sob camadas de esquecimento, defesas e repressão.
‘O analisante não saber que sabe’ é a chave para a descoberta. É a aposta de que, dentro de você, existem elementos pra compreender sua própria jornada, seus impasses, seus desejos, suas motivações mais profundas. E, finalmente, com ajuda da relação terapêutica, encontrar essas conexões e possíveis caminhos de transformação.

A sessão analítica é como uma dança sutil. De um lado, o analista cria um espaço seguro para que o que é inconsciente possa emergir. Do outro, o analisante começa a permitir que seu saber oculto se revele, em suas experiências e dilemas, palavra por palavra.
É um percurso em que algo se produz na relação transferencial, a partir tanto da fala como do silêncio, e da escuta. Não se trata de o analista ensinar algo a quem analisa, mas de sustentar uma presença livre de julgamentos pra que o sujeito possa (re)aprender sobre si mesmo.
A psicanálise convida a assumir uma posição mais implicada diante do que se vive, e não mais ser tão carregado pelo sintoma e olhar do outro. A dar lugar ao que insiste em se dizer - ainda que de modo enigmático - e que, até então, estava encoberto pelas defesas do (seu) eu.




Comentários