Penso... logo, nego? Racionalização e Negação
- Maria Carolina Passos
- 4 de dez.
- 2 min de leitura
Penso, logo existo diz a icônica citação de Descartes. Mas, na clínica, às vezes o que vemos é o contrário: penso demais = pra não existir.
A razão, tão cultuada no discurso contemporâneo, costuma ganhar um verniz moral. Quem nunca ouviu ou falou um “estou tentando ser racional aqui”? Como se a racionalidade fosse sempre um gesto maduro, lúcido, elevado... nem sempre, né?

Na psicanálise, Racionalização e Negação surgem justamente quando o eu tenta se proteger daquilo que ameaça irromper: um desejo, um conflito, um desprazer que insiste.
RACIONALIZAR é organizar, explicar, justificar. É transformar o afeto que incomoda numa narrativa polida. Uma história tão bem explicada que, no fundo, mantém tudo exatamente no lugar de antes.
A NEGAÇÃO, irmã próxima, faz algo parecido, impondo uma certeza onde está justamente o que não se quer ver. É quando alguém diz “não é nada”, mas o corpo já sabe que é.
uriosamente, ambos mecanismos se apresentam como prova de sanidade, uma espécie de superpoder cognitivo. Mas o que eles realmente fazem é impedir a experiência. A mesma experiência que, se escutada, poderia deslocar algo.
Ser “racional demais” costuma significar: eu me distancio de mim pra não ter que me encontrar.
O problema não é pensar; é pensar pra afastar. É usar a lógica como muralha, não como caminho.
Em análise, a pergunta que pode trazer verdades à tona raramente gira em torno de: qual é a explicação disso? É preciso abrir espaço pro inadmissível, ir no que aquele pensamento te impede de tocar e sentir.
Porque, no fim, existe uma diferença (às vezes sutil, outrora gritante) entre usar a razão, e ser dono(a) da razão pra se esconder.




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